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Publicado em Maio 11, 2020

Falemos de comida… textos da aula 3 do Workshop Online de Escrita para Blogues

Workshop de Escrita

Durante muitos anos escrevi sobre comida. Escrevi em várias publicações (em papel) sobre as minhas experiências em restaurantes. Eram tantos caracteres, todas as semanas, que por vezes tinha muita dificuldade em conseguir ser criativa e arranjar outras palavras ou termos para conseguir escrever de forma diferente. Lembrei-me disso e peguei nesse esforço, que me recordo que tinha de fazer, e trouxe-o para o terceiro exercício do Workshop Online de Escrita para Blogues, do Viaje Comigo.

“Vamos escrever sobre comida! De que gostam? Onde comeram a melhor comida, e a pior? A que soube? Lembram-se dos cheiros, dos ingredientes, das especiarias, etc.; e dos cozinheiros?; foram vocês que cozinharam?; veio parar-vos à mesa?; viram outros a cozinhar? Vamos deixar os leitores ficarem com água na boca!”

As respostas a estas questões surgiram em mais de três dezenas de textos sobre histórias e “estórias” de comida, provas gastronómicas, experiência cómicas, saudosas e bizarras. Pela terceira semana consecutiva este é o resultado das aulas do Workshop Online de Escrita para Blogues. Os textos, abaixo publicados, são da autoria dos participantes desta atividade. Alguns preferiram manter o anomimato, por isso, alguns textos mantêm somente as iniciais como assinatura. Estão aqui publicados, consoante a ordem de chegada ao meu e-mail. Parabéns a todos!

TÍTULOS DOS TEXTOS SOBRE COMIDA/GASTRONOMIA
1 – O aconchego da alma, SJ
2 – A fome é o melhor tempero ou os Marroquinos cozinham bem?, Ana Catarina Santana
3 – Sabores da Via, Sandra Yonekura
4 – A sabedoria divina num cheesecake, Catarina Silva
5 – Hell’s Kitchen: do bife Wellington à fuga, Ana Margarida Fernandes
6 – Amor: o ingrediente mágico!, Rui Castro
7 – O sabor a férias, Dália Cavaco
8 – A comida vietnamita, pela primeira vez, Pedro Rocha
9 – A comida é mensageira de Deus, Sara A.
10 – Comer consentido, Liliana Sousa
11 – Paladar, a quanto obrigas!, Maria Saraiva
12 – A comida que nos une, Cláudia Duarte
13 – Quando o amor é sazonal e come-se à colher, IG
14 – O mal que fazia pelo bem que sabia!… Memórias gastronómicas, Cidália Alves
15 – Alternância de Sabores, Carolina Salgueiro
16 – O amor de mãe em forma de pastel, CR
17 – Um jantar que nos encheu os sentidos, Sofia Martins
18 – As melhores panquecas de Amesterdão!, TG
19 – A Comida e a Memória, Marisa Heliodoro
20 – Sopa de canela nas ilhas das especiarias, Pedro Moita
21 – Uma experiência culinária imersiva, LS
22 – O insuperável Brownie Top, ZT
23 – Bordéus Gastronómica, Adriana Cunha
24 – Comer, viajar, fotografar!, Vanessa Rodrigues
25 – Que vem na ementa d´hoje?, JPF
26 – A comida que dá cor, cheiro e sabor à nossa história, Soraia Peixoto
27 – O Tempero perfeito para a alma!, Sandra Antunes
28 – O paladar é para cuidar, Diogo MF
29 – Comer como um português, Pedro Domingues
30 – Dicas gastronómicas de uma nómada viajante, CDM
31 – Boeuf Bourguignon, KP

1 – O ACONCHEGO DA ALMA

Sabem o que realmente me aconchega a alma? A comida. Acontece convosco?
Alimenta o corpo, alimenta a nossa alma. Quantas vezes descarregamos num doce a frustração de um dia menos bom? Quantas vezes celebramos com uma refeição especial uma data, um aniversário, algo que nos enche de alegria? A comida é o aconchego da alma. Não importa se em casa ou fora. Colmata o vazio da tristeza e enaltece os momentos de alegria. Nunca pensaste nisso?

E aqueles dias, em que o arroubo do filme nos faz ir buscar algo, à cozinha, para trincar. Ou o cheiro de um bolo, acabado de sair do forno, numa tarde chuvosa, de domingo, rendidos à preguiça do sofá. A partilha de umas amêijoas à bulhão pato que nos fazem recordar, um fim de tarde na praia, a apanhar os últimos raios de sol, numa mesa rodeada de amigos. Existe sempre comida a acompanhar-nos. Sozinhos ou não! Temos sempre o lugar da comida reservado, seja na mesa, no sofá ou até em pé. Depois, existem pratos especiais, aqueles que saboreamos uma vez no ano, únicos. Na consoada, até sinto o cheiro do azeite quente, com alho a crepitar, a regar o bacalhau lascado que assenta em camadas intercaladas de pão centeio e couve, servido num alguidar de barro que ajuda a manter o sabor. Um sabor de gerações. Um sabor genuíno. Um sabor diferente. É só servido naquela noite, e é exatamente isso que faz dele um prato especial, pelo qual anseio durante um ano, até á próxima consoada.

Comer é mais do que um simples ato de ingerir alimentos. Comer é partilha. É uma fonte de recordações, de sabores, de cheiros, de pessoas. Associamos a lugares e nela revivemos histórias. Pode ser simples ou elaborada. Pode ser o que quiseres… Adoro comer. Gosto de quase tudo e mesmo que haja algo que não aprecie tanto, não deixo de provar. Pode ter um sabor diferente. Pode estar carregada da alma de quem a fez. Tantas vezes ouvimos dizer que foi feita com amor. A comida aconchega a alma, de quem a faz e de quem a prova. Vamos comer?

Autor: SJ

2 – A FOME É O MELHOR TEMPERO OU OS MARROQUINOS COZINHAM BEM?

A gastronomia é muito mais que saber cozinhar ou misturar ingredientes avulsos num tacho com água. É a arte de misturar sabores e conseguir criar experiências e sensações que nos são servidas num simples prato. Seja em viagem ou em casa, para mim, comida não é questão de sobrevivência. Comida é prazer. Vai do bolo quente feito pela minha avó à tagine de Marrocos.

Ali estava eu, no calor de Marrocos, num fim de dia em Marraquexe, exaurida de tanto palmilhar e me perder, literalmente, em souks. Aquilo não é fácil! A fome apertava e o pôr do sol prometia. Sunset, se quisermos ser mais internacionais e modernos. Entrei num dos famosos terraços (ou rooftop, não me chateiem com as modernices) da Jemaa El Fna, subi e sentei-me junto ao varandim. Olhei para a ementa e arrisquei numa tagine. Não sei se foi a fome que a temperou ou se foi um Deus Marroquino naquela cozinha. O empregado de mesa traz até mim aquela pequena pirâmide de barro, retira a tampa e coloca à minha frente a base da pirâmide. Tentei não pensar nas condições de higiene da cozinha ou no que realmente consistiam aqueles temperos. Sabe Deus! Fechei os olhos e provei. O cheiro que senti das especiarias nos souks, estava a agora a fumegar até mim. A combinação do ovo com as pequenas almôndegas fez desaparecer toda a exaustão que sentia. Entre uma garfada e um gole do sumo de laranja, senti a cultura da cidade.

Para mim, o maior segredo da gastronomia é o que nos transmite. É a combinação do momento, com a ocasião e as memórias que nos traz. Se aquela tagine é a melhor de Marraquexe? Muito, muito possivelmente não será. Mas a combinação do ambiente da praça, com o som da cidade a fervilhar lá em baixo, a excitação de conhecer uma cidade nova, aliada à exaustão e à fome fez com que, para mim, fosse sim a melhor da cidade. E ai de quem me venha dizer que não é a melhor tagine da cidade!

Autor: Ana Catarina Santana

3 – SABORES DA VIDA

Sei cozinhar muito pouco e em regra, minhas esparsas incursões culinárias foram uma prova de resiliência das ‘vitimas’! Nunca me interessei em aprender mais, embora tenha uma mãe que o faça muito bem! Cozinhar e partilhar com afeto desta arte com os demais é sempre um momento de entrega, de criação e de comunhão. Muitas reuniões familiares em volta da mesa ou até mesmo lanchinhos com pastéis e bolos para os coleguinhas de escola, me trazem lembranças de um tempo despreocupado e agradável. Sou daquelas adeptas do ifood e dos pratos feitos, mas sei apreciar os prazeres da boa mesa. Vivendo no Brasil onde se há um caldeirão de etnias e regionalismo, cedo estive exposta aos mais variados sabores. Em minhas viagens estou sempre aberta às novas experiências gastronômicas, desde que não sejam muito bizarras, (hábitos culturais à parte), como por exemplo comer cobras ou morcegos ou Deus me perdoe, cães e gatos!

Como já afirmei aprecio muito a culinária estrangeira! Sendo descendente de japoneses esta é a última das minhas opções no exterior…não vejo sentido em experimentar mais do mesmo. Adoro a cozinha portuguesa e seus vinhos deliciosos, sem falar das pastas italianas e das suculentas paellas espanholas. Tenho especial apreço pela cozinha mexicana e indiana e em destaque a turca (até o sorvete é feito de modo criativo!), embora às vezes me pareçam um pouco fortes. Da americana posso dizer que detesto ‘fast food’, mas uma torta de maçã cai bem! Da Inglaterra o que eles tem de autêntico além ‘fish and tips’ só por curiosidade? Não sou exatamente apreciadora de ‘parilladas’ argentinas e uruguaias ou do aclamado ceviche peruano.

Impressões à parte posso afirmar que o mais inesquecível jantar que tive foi desfrutando a culinária marroquina! Cuscuz, tajine, kafta, (espetinho), pães numa tenda montada no deserto. Um acampamento de luxo pronto para um autêntico jantar com ‘figurantes’ à caráter, cercada de gente aventureira e risonha! Tudo contribuiu para uma refeição perfeita finalizada ao som de música local com instrumentos típicos. Uma noite estrelada como jamais e que estará sempre entre as minhas mais queridas memórias.

Autor: Sandra Yonekura

4 – A SABEDORIA DIVINA NUM CHEESECAKE

Recordo-me que quando era mais nova não tinha grande apetite, era mesmo um sacrifício comer o que tinha no prato. A minha mãe até me comprava umas vitaminas para que eu comesse mais, e eu quero acreditar que fizeram algum efeito, mas que este só se manifestou mais tarde, na fase da adolescência. Como não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe, com o passar do tempo, comecei a apreciar umas boas entradas e sobremesas, adoro petiscos e doces. Há uns dois anos a minha prima apresentou-me o melhor cheesecake de frutos vermelhos. Nunca fui muito fã, sempre achei uma sobremesa da moda, com um sabor modesto e com uma consistência, em alguns casos, um pouco duvidosa. Este era diferente, irresistível, único.

Onde podemos apreciar esta iguaria? Num hotel, em Coimbra! Devo confessar que, para mim, o espaço é também muito importante, e eu adoro hotéis que têm vida para além das estadias normais. A zona do restaurante não é muito grande, calma e com um atendimento próximo, combina na sua decoração um estilo industrial e rústico, tudo em perfeita harmonia. Um dos lados é envidraçado e conseguimos ver através dele o pátio, no centro tem uma árvore frondosa que dá uma sombra gigante, ótima no verão. Tem também um pequeno lago onde habita uma tartaruga – a guardiã do pátio, uma zona com mesas e cadeiras e outra mais acolhedora com sofás.

Foi ali, naquele magnífico espaço, onde apenas se ouvem os sons da natureza, que degustei pela primeira vez o famoso cheesecake. Veio servido de uma forma harmoniosa, numa ardósia com o logotipo do hotel, feito com açúcar em pó. É composto por uma base de bolacha compacta que se dissolve na boca, no meio uma camada ebúrnea bastante aveludada, e por cima tem uma calda de frutos vermelhos, com morangos frescos cortados em pequenos cubos, ligeiramente ácida que contrasta com a doçura das camadas.
Gosto sempre de lá voltar, até porque todos os pratos daquela ementa, que é sazonal, são deliciosos. E a vista do terraço? Hum…só de imaginar! Conto-vos, tudo o resto, um dia destes.

Autor: Catarina Silva

5 – HELL’S KITCHEN: DO BIFE WELLINGTON À FUGA

Las Vegas é uma cidade louca que gira sobre si própria, num turbilhão de excentricidades que só ali são possíveis de ser admiradas. Às vezes, até para descobrir a comida certa é preciso ter alguma insanidade, algo que não faltou às duas portuguesas com grande apetite mas de carteiras limitadas. Estas duas raparigas estavam determinadas a provar o melhor bife Wellington do mundo, quiçá da galáxia, mas deixar aquelas gorjetas obrigatórias nos restaurantes era algo que rejeitavam. À porta do Hell’s Kitchen, elas engendraram um plano e pensaram numa fuga, tudo para comerem o famoso bife.

Naquele dia escaldante de Julho, as duas sonhadoras raparigas pararam no restaurante Hell’s Kitchen, do conhecido Chef Gordon Ramsay. Nesse momento, toldado talvez pelo calor, o seu pen-samento foi de entrar no restaurante e degustar a mais refinada comida. O calor não abrandou, a loucura aumentou e as raparigas entraram. O ambiente e a música estavam fantásticos mas, trouxe-ram a ementa, os preços eram assustadores e o desejado bife custava 60 dólares. Mas a vontade era grande e a determinação, essa, era gigante. Dividiram um, acompanhado de água da torneira para não aumentar o valor. Passados uns 20 minutos chegou à sua mesa uma sublime esfera com a carne no interior, coberta dos melhores cogumelos selvagens e tudo embrulhado numa massa folhada fina e perfeitamente alourada no forno. A acompanhar vinha um puré de batata riscado no prato e por cima dele três folhas de um vegetal e, ali ao lado, estavam três tomates cereja a dar cor àquela composição. A carne desfazia-se nas suas bocas, era macia e hauria a vontade de a consumir rapidamente. Foi um repasto glorioso mas havia que pagar por ele.

O plano inicial de pedir, pagar o valor do prato sem dar gorjeta e sair rapidamente do restaurante resultou e as duas refasteladas portuguesas saíram com o corpo e a alma preenchidos. Aquela sen-sação de conquista foi estupenda e ambas sonharam com aquele bife de sabor e textura únicos. Falaram disso durante dias, contaram a toda a gente a história e, juntas, fizeram figas para um dia voltar.

Autor: Ana Margarida Fernandes

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