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Publicado em Abril 27, 2020

Vamos falar de saudade? Textos da aula nº1 do Workshop Online de Escrita para Blogues

Workshop de Escrita

16 – MUDANÇAS

Tenho saudades de ser quem era. Nem sei porque mudei. Ou será que sei? Foram mudanças tão subtis, aconteceu tudo tão devagar, tão pouco a pouco que quando dei conta já estava assim.

Olhando para trás não consigo perceber porque não vi o que se passava, como pude estar tão cega com algo que abomino. Sei que a culpa não foi minha, estava iludida com algo que não era real, mais uma vez fui enganada. Foste impondo as tuas regras aos poucos até o meu coração estar na tua teia, depois disso fizeste o que quiseste. Usaste-me e moldaste-me à tua vontade. Não te culpo já passei essa fase, também não me culpo, era nova demais para o perceber. Só a revolta é que não passa, mudei e não sei quem sou.

E agora? Não consigo retornar ao que era antes, nem isso é possível! Foram tantas as provações, tantas as facadas que já não o consigo fazer. Não consigo confiar em mim, perdi toda a força que tinha, perdi toda a confiança em mim. Não sei como continuar a lutar, só sei que tenho que me encontrar de novo, fazer as pazes comigo, tenho de me reinventar.

Autor: PA

17 – COMPASSO DE ESPERA

Neste atual mundo surreal…quase cenário de filme apocaliptico ao qual tentamos ir seguindo cada qual dentro da sua realidade ou bolha… estava eu mexendo vorazmente em redes sociais… (sinal de muito tempo em mãos, tédio ou válvula de escape?) quando me deparei com lembranças multicoloridas de viagens realizadas!

Ah…! Que saudades imensas até mesmo da comida ruim das companhias aéreas, do jet leg, dos eventuais atrasos ou até mesmo do ronco dos vizinhos! De vivenciar novos sabores, aromas, culturas, paisagens e contato com gente desconhecida que nunca vimos e provavelmente não mais veremos! Que febre é esta que acomete os viajantes e uma vez a nos possuir não vai mais embora e nos faz desejar jamais achar a cura?

Até quando teremos de nos confinar e forçosamente nos conformar? Nos olharmos com indisfarçável suspeita por detrás de máscaras, nos mantermos à distância, quase ralar as mãos de tanto lavá-las e não ser capaz de planejar nada para um futuro próximo? Até quando esta aridez de suportar esta falta de perspectiva e expectativa que uma nova viagem nos traz?

Autor: Sandra Yonekura

18 – SAUDADES DO DESCONHECIDO

Voltemos no tempo até novembro de 2016. O avião aterra finalmente num dos aeroportos daquele país tropical. As portas abrem-se para deixar sair a multidão de pessoas cansadas de estarem fechadas, mas extasiadas por terem finalmente chegado ao seu destino. Nunca tinha estado num sítio assim e daí ter a excitação e curiosidade características de quem de vê tudo pela primeira vez, com olhos de criança. É mesmo desta saudade que vos falo hoje. Saudade de descobrirmos ou aprendermos alguma coisa, de vermos ou fazermos algo novo que nunca fizemos antes.

O cheiro dos trópicos foi a primeira coisa que senti ao pisar aquela terra, aquele cheiro de calor, humidade, flores e mar. E depois saí do aeroporto e é aí que começou o choque: motas e carros a conduzir freneticamente e a buzinar sem cessar, estradas ladeadas de dezenas e dezenas de cabos eléctricos pendurados nos postes e emaranhados uns nos outros num cenário bizarro, bancas de rua com frutas que nunca vi antes, natureza a crescer em cada canto, e de vez em quando um vislumbre de uma praia paradisíaca. Nesta terra, os dias são de sol, as noites de trovoada. Vêem-se elefantes à beira da estrada, o mar tem peixes de todas as cores e árvores de flores decoram as ruas. Exploro sítios tão invulgares quanto maravilhosos, interajo com as pessoas que povoam aquele sítio, tão diferentes mas tão iguais a mim. Experimento o que eles comem, e é tão saboroso! Depois, saio dali e percorro quilómetros e quilómetros até chegar à cidade. A cidade é de contrastes a todos os níveis: arranha-céus lado a lado com templos; de um lado palácios e do outro casas de madeira em estacas no rio. O moderno e o tradicional, o extravagante e o simples, o rico e o pobre, a confusão e a calma. Prédios, carros, árvores e pessoas, muitas pessoas, todas amontoadas umas às outras.

A sensação inicial de estar desencaixada, num mundo e lugar que não são os meus, já passou e deu lugar a um fascínio e admiração por todas aquelas coisas tão diferentes que me invadiram os sentidos. É aí que começo a sentir saudades. Ainda lá estou mas já sinto saudades por pensar que estes dias têm um prazo de validade e depressa chegam ao fim. E chegaram. Voltei a casa, ao meu lugar de sempre, com a certeza de que aquela experiência acrescentou algo à minha vida e me fez mais feliz e completa – afinal é disso mesmo que se trata a saudade não é? Aquele sentimento agridoce que nos lembra que vivemos momentos maravilhosos mas que ao mesmo tempo nos atormenta por eles já não fazerem parte do presente.

Autor: Cláudia Duarte

19 – TUDO É SAUDADE

Tudo aquilo que é ou foi importante num momento da minha vida, traz-me saudade quando as memórias são boas e têm um papel importante na minha vida. Tenho saudade daquilo que amo, se amo é porque é importante e por isso quero preservar em mim para sempre.

Sinto saudade de pessoas especiais, de lugares bonitos, de momentos únicos que vivi, que por um momento ou para sempre estão ausentes da minha vida. Refiro-me a pessoas especiais, família, amigos que infelizmente perdi e que não voltarão. Lugares bonitos e momentos únicos que a vida me vai dando oportunidade de conhecer através de viagens e pessoas, são experiências que nos enriquecem e trazem saudade quando não as temos.

Sentir saudade é querer manter viva a existência de algo ou de alguém importante, é ter o desejo de reviver, de partilhar, de guardar as recordações para sempre na memória. Sinto saudade de tudo o que me traz felicidade.

Autor: Marisa Heliodoro

20 – SAUDADE DO AGORA

Começo a perceber agora que talvez exista dentro de mim um lado meio perverso. É que estou realmente a gostar de estar em quarentena. Talvez seja por ser do signo Caranguejo, que segundo os Antigos, adora estar em casa, a comer e no dolce fare niente. Estar totalmente entregue a esta indulgência numa casa repleta de história e fantasmas, na qual todos os recantos levam a uma memória ancestral desde a bisavó Laura, que era parteira à tia-avó que era surda. Como não desfrutar deste tempo sem tempo e dos seus segredos?

Mas o meu lado sombrio espreita de novo e, para ser franca, também tem o seu lado stressante aturar esta malta toda! Para além de haver gente em todas as divisões da casa, vozes que nunca se silenciam, refeições de duas em duas horas, acaba por ser complicado fazer amor com o meu marido. Acredito piamente que já experimentamos todas as posições do Kamasutra para perceber em qual delas a cama chia menos.

Bem, mas falando do que importa. Estou neste misto de antever que assim que for possível sair deste modo de vida, vou sentir imensas saudades destes tempos. Quem me garante que o Universo não me está a dar esta oportunidade de estar em família por alguma razão? Não será uma bênção poder estar de novo, por tanto tempo, com quem me criou? Será que é a última vez?
Algo me leva a crer que estou no caminho inverso da Saudade… é que mais do que sentir nostalgia por tempos ausentes, estou a viver intensamente um tempo que irei desejar nunca ter terminado.

Autor: SR

21 – SAU·DA·DE

Portugal, Abril de 2020 em plena Epidemia de Saudade

sau·da·de
1. Lembrança grata de pessoa ausente, de um momento passado, ou de alguma coisa de que alguém se vê privado
2. Pesar, mágoa que essa privação causa.
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa

Saudade é muito mais do que isto. É uma das razões pelas quais nos podemos orgulhar de ser portugueses. Porque é aquela palavra só nossa, que não tem tradução em nenhum dos muitos países dos 6 continentes do mundo. É incrível, não é? Enche-nos o peito de orgulho até porque sendo uma palavra só nossa arrisco-me a acreditar que só nós sentimos a “saudade” no seu sentido mais puro. E acredito que nunca tanto como em Abril do ano 2020 tivemos o peito tão cheio de “saudade”. Quantas vezes desde o início deste confinamento obrigatório demos por nós, no meio da nossa casa, completamente abraçados pela “saudade” (haja “alguém” que nos possa abraçar pelos menos!)? Conseguem contar? Eu não… precisaria, talvez, dos dedos de todas as pessoas que neste momento só quero poder abraçar. Porque sinto saudade em cada canto da minha casa…

O país está praticamente parado, a grande maioria dos portugueses estão em casa fechados, a salvo deste vírus horrível que obrigou o mundo inteiro a parar, mas estamos todos a morrer, de saudades. Dizemos muitas vezes a expressão “estava a morrer de saudades tuas” mas acho que só agora a compreendemos verdadeiramente. Temos saudade até de coisas que nem imaginávamos que alguma vez teríamos (eu, por exemplo, nunca pensei ter saudades do ginásio…) Olhamos para uma fotografia e de repente o nosso peito enche-se de uma tal maneira que parece que vai explodir. É a saudade! A coisa que mais queríamos era ter uma máquina de viajar no tempo para poder estar a tirar aquela fotografia novamente, naquele lugar, com aquelas pessoas…

A parte boa da saudade é, quando é possível, “matá-la”, quando finalmente podemos abraçar aquela pessoa, por exemplo. Aquela sensação de que o nosso peito vai explodir é substituída por um conforto tão grande que vale a pena esperar por ele. Mas até isso tivemos de reinventar! Mandamos abraços virtuais, comunicamos pela janela, esgotamos horas em videochamadas, simulamos almoços entre família e amigos (cada um na sua casa), cantamos parabéns à distância (fiz um bolo para o aniversário da minha mãe que ela não provou, apenas viu pelo ecrã do telemóvel enquanto soprava as velas a 80km de distância)…. Mas nada disto chega para matar a saudade. Quando tudo isto terminar, quando “matarmos” a COVID-19, vamos ter muita saudade para matar. Vamos querer fazer tudo ao mesmo tempo, correr para todos, abraçar todos ao mesmo tempo, e mesmo assim não nos vamos sentir saciados…

Que esta epidemia de saudade que estamos a viver neste tempo de Pandemia nos faça agarrar cada nova oportunidade para abraçar, beijar, dizer o quanto se gosta. Que demos mais valor a coisas que nos pareciam tão simples mas que agora nos enchem de saudade. E que nunca nos esqueçamos que a pior parte desta palavra tão só nossa, é quando não se pode “matar a saudade” com um abraço, com um toque, com uma viagem de volta… Nessas alturas, entra outra palavra tão só nossa, O Fado, que conta as histórias de muitas saudades que não se puderam matar.

“Já cada qual tem seu fado
O mais feliz é o teu, tenho a certeza
É o fado da pobreza
Que nos leva à felicidade
Se Deus o quis
Não te invejo essa conquista
Porque o meu é mais fadista
É o Fado Da Saudade”

Fado da Saudade- Amália Rodrigues

Autor: Vanessa Rodrigues

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