Avião Latam, aeroporto de Calama, Chile © Viaje Comigo
Publicado em Abril 3, 2020

A minha experiência com o e-mail do MNE Covid-19 e Embaixadas

Covid-19

Durante a minha grande “aventura” em sair do Chile e voltar para Portugal – durante a pandemia da Covid-19 – contactei duas embaixadas (Santiago do Chile e Madrid) e também o e-mail (covid19@mne.pt) que foi criado, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, para ajudar portugueses que estavam no estrangeiro, quando (quase) todos os países do mundo começaram a fechar as suas fronteiras. Enquanto que com as embaixadas consegui manter um contacto quase imediato, apenas obtive a resposta àquele e-mail uma semana depois, ou seja, já estava em Portugal.

No avião © Viaje Comigo

No avião © Viaje Comigo

Sem querer fazer nenhuma crítica negativa, porque ninguém (ninguém mesmo!) estava preparado para o que tem acontecido, venho fazer algumas sugestões de forma a ser uma crítica construtiva… isto porque acredito que todos estejam a fazer o que é possível para atravessar esta crise. Eram dezenas de milhares os portugueses que estavam em viagem quando os países começaram a fechar as fronteiras. As minhas perguntas são:
– quantas pessoas estavam encarregues de responder ao e-mail covid19@mne.pt? (eram manifestamente insuficientes uma vez que me responderam uma semana depois)
– que profissionais são esses que ficaram com a responsabilidade de responder aos milhares de portugueses, em viagem ou a viver lá fora? Essas pessoas estão preparadas para uma gestão de crise? Estão a par dos constrangimentos que podem acontecer, neste tipo de situação (ou em caso de um Golpe de Estado, de uma guerra, etc.), nos aeroportos e com as companhias de avião (isto pergunto devido à resposta que me enviaram e que poderão ver mais abaixo).

Mais uma vez, sublinho, não é uma simples crítica, mas apenas perguntas e uma chamada de atenção para que, numa próxima gestão de crise, se possa agilizar melhor este atendimento e dar o apoio que as pessoas de facto precisam.

Ora, na minha ótica, se se cria uma linha e um e-mail propositadamente para o caso é um pouco curioso que só uma semana depois tenham enviado uma resposta…

E a minha questão fulcral é esta: foi um vírus que criou toda confusão, mas… suponhamos que era o início de uma guerra, uma explosão nuclear, algo que afectasse de igual forma o mundo inteiro, o encerramento de fronteiras e dos aeroportos… as embaixadas e os consulados estão preparados para ajudar os seus compatriotas? Peço desculpa, pela frontalidade, mas não me pareceu, pela minha experiência e pela experiência de outros portugueses com quem fui mantendo o contacto.

Com a embaixada de Santiago do Chile consegui manter um contacto diário e ajudei-os a passar a palavra de que deveríamos sair do país quanto antes, uma vez que iam haver cada vez menos voos para a Europa. Ou seja, na prática não me ajudaram em nada mas, só o contacto direto já me deu a perceber que estavam a tentar resolver casos muito graves (o meu não era grave, claro) e percebi que podia fazer mais por eles, do que eles por mim.

Segundo informação online, da RTP: “O Ministério dos Negócios Estrangeiros criou uma Linha de Emergência Covid-19. A linha está disponível pelo número +351 217 929 755 e pelo e-mail covid19@mne.pt
O objetivo é apoiar os portugueses que se encontrem transitoriamente em viagem no estrangeiro e que precisem de ajuda para regressar a Portugal.
Esta linha estará disponível nos dias úteis entre as 9h00 e as 17h00.
Fora deste horário, os viajantes podem recorrer ao Gabinete de Emergência Consular, em funcionamento 24 horas por dia”.

A partir de Portugal, amigos e família diziam-me para contactar este e-mail e que teria ajuda. Aliás, a esperança deles estava toda neste contacto… cuja resposta recebi uma semana depois. Quando saí do Atacama e cheguei a Santiago do Chile (longa história que conto aqui), no dia 18 de março, enviei um e-mail para o Covid-19, onde escrevi:

“Olá,
consegui sair do Atacama e estou em Santiago do Chile. Só consegui voo para dia 20 e vou para Madrid e depois tenho de ir para o Porto… como? Não sei.
Como não tenho a minha ligação ao Porto, nem voo nem comboio, gostaria de saber se estão a criar algum tipo de ligação especial para Portugal: nomeadamente para os portugueses que estão chegar a Madrid vindos da América do Sul.
Desde já, agradeço toda a vossa ajuda.
Obrigada!!
Susana Ribeiro”

Já em Portugal, recebi a resposta, dia 24 de março:

“Exma. Senhora Susana Ribeiro
Acusamos a receção da sua comunicação. Infelizmente a situação epidemiológica provocada pelo novo coronavírus coloca grandes dificuldades de circulação entre países com a implementação de sucessivas restrições ao tráfego aéreo, o que torna progressivamente difícil encontrar soluções previsíveis, uma vez que as companhias aéreas não estão, naturalmente, sob a nossa alçada.
Desde já as nossas desculpas pelo atraso na resposta no entanto esperemos que a situação já se encontre resolvida caso não agradecemos que nos contate.
Com os melhores cumprimentos,”

Ora, como é possível ler, a resposta não ajuda nem adianta nada, uma vez que dá a informação que, alguém que andou por diversos aeroportos, já tinha chegado àquela conclusão. Além do mais, dizer a alguém que está retido que “as companhias aéreas não estão, naturalmente, sob a nossa alçada” é chamar-nos um bocadinho (muito, vá) de estúpidos.

Asa do Avião © Pixabay

© Pixabay

Quando eu falava com os meus amigos e família a dizer que a sair do Chile, a ideia que existia em Portugal e que me passavam era que “nenhum português ia ser deixado para trás”, segundo declarações de responsáveis do Governo. Confesso-vos que nunca confiei nisso e, por isso, fiz-me aos aeroportos e aos voos e consegui chegar. Mas sei que tive muita sorte (!) e muitos não a tiveram. O “nenhum português ia ser deixado para trás” passou, pouco tempo depois, para as declarações: “O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) não é uma agência de viagens”. O que, a bem da verdade, a coerência vai ao encontro com as respostas do e-mail da Covid-19. Mais uma vez são declarações que não ajudam em nada e que podia ser evitadas. Até admito que as possam pensar, mas dizer… é um pouco demais.

Claro que o MNE não é uma agência de viagens. Todos sabemos isso. E muitos sabiam que iam ser deixados à sua sorte, mas uma palavra de alento – ou cruzar contactos de outros portugueses para que se pudessem entreajudar – já seria um grande apoio… digo eu! Portanto, não esperando grande ajuda, parti para Portugal, mas a verdade é que…

Quando Portugal e Espanha encerraram as suas fronteiras – e eu tinha o último voo de Madrid para o Porto – eu não sabia como ia chegar a casa. Estar fechada num voo durante quase 11 horas (entre Santiago do Chile e Madrid) deixa-nos numa incerteza muito grande. Se todos os dias o mundo estava a mudar, e o vírus a alastrar a cada minuto… em 11 horas de voo tudo podia mudar e eu não conseguir arranjar carro ou voo para chegar a casa. Antes de partir, enviei um e-mail para a Embaixada de Portuga em Madrid.

Se o MNE “não é uma agência de viagens” é sabido que o facto de Portugal e Espanha fecharem fronteiras trazem algumas impossibilidades para quem quer chegar a Portugal. Não havia voos, claro, não havia já partilhas de carros, os autocarros estavam já esgotados e não sabia mesmo como chegar a Portugal. Pensei que pudessem estar pensados transportes para quem quisesse atravessar a fronteira, sob supervisão das entidades portuguesas e espanholas (uma vez que Madrid inteira estava de quarentena). O transporte seria obviamente pago por nós. Mas, pelo visto, ninguém pensou nisso…

Foto avião © Viaje Comigo

© Viaje Comigo

Enviei este e-mail:
“Olá!
consegui sair de San Pedro de Atacama e estou em Santiago do Chile. Só consegui voo para dia 20 e vou para Madrid e depois tenho de ir para o Porto… como? Não sei.
Como não tenho a minha ligação ao Porto, nem voo nem comboio, gostaria de saber se estão a criar algum tipo de ligação especial para Portugal: nomeadamente para os portugueses que estão chegar a Madrid vindos de outros pontos do mundo?
Desde já, agradeço toda a vossa ajuda.
Obrigada!!
Susana Ribeiro”

A resposta que recebi da Embaixada de Portugal em Madrid:

Exma. Senhora,
Susana Ribeiro
Antes de mais, lamentamos a situação em que se encontra.
Neste momento de alerta não estão previstos repatriamentos para territorio nacional.
O tráfego aéreo de passageiros entre Espanha e Portugal encontra-se suspenso. A solução seria alugar um carro, ou procurar um táxi ou autocarro que a leve à fronteira com Portugal.
A travessia por Espanha via terrestre poderá ser difícil ou impossível já que a Guarda Civil espanhola pode impedir o seu passo.

Contudo, informamos que as limitações ao tráfego entre Portugal e Espanha não afetam:
– O direito de entrada dos cidadãos nacionais e dos titulares de autorização de residência nos respetivos países.
– A organização de operações de repatriamento de cidadãos nacionais, a partir ou através do território de uma das partes.
– A circulação do pessoal diplomático e das forças e serviços de segurança.
– A circulação, a título excecional, para efeitos de reunião familiar de cônjuges ou equiparados e familiares até ao 1.º grau na linha reta.
– O acesso a unidades de saúde, nos termos de acordos bilaterais relativos à prestação de cuidados de saúde.

Mais informamos que o tráfego rodoviário é autorizado através dos seguintes pontos de passagem:
– Valença – Tuy.
– Vila Verde da Raia – Verín.
– Quintanilha – San Vitero.
– Vilar Formoso – Fuentes de Oñoro.
– Termas de Monfortinho – Cilleros.
– Marvão – Valência de Alcântara.
– Caia – Badajoz.
– Vila Verde de Ficalho – Rosal de la Frontera.
– Vila Real de Santo António – Ayamonte.
Atenção: a passagem da fronteira fora dos referidos locais autorizados é sancionado nos termos da legislação penal.

Chamamos atenção para que o trânsito por território espanhol está interdito a cidadãos portugueses não residentes habitualmente em Portugal. Poderão fazê-lo para regressar todos os que se encontrem temporária e esporadicamente fora do país (devem apresentar documentação que comprove residência em Portugal).

Contactos importantes:
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que disponibiliza os seguintes contactos para esclarecimento de dúvidas sobre esta matéria: Covid19@sef.pt ou gtf.csf@sef.pt

Ministério dos Negócios Estrangeiros que disponibiliza a linha de apoio covid-19, acessível por telefone através do número + 351 217 929 755 e e-mail: covid19@mne.pt.

Com os melhores cumprimentos,
Secção Consular da Embaixada de Portugal em Madrid.”

Não me posso queixar. Foram rápidos e responderam no dia seguinte e com bastante informação. Mas, confesso que de tudo o que está ali escrito esta foi a que mais me deixou mais nervosa; “A travessia por Espanha via terrestre poderá ser difícil ou impossível já que a Guarda Civil espanhola pode impedir o seu passo.”
Mas, se não existe nenhuma forma de chegar a Portugal, a não ser de carro (ou a pé, claro), como vou eu chegar lá?

Como tive de correr para apanhar o voo para Madrid, todas estas questões ficaram suspensas até aterrar. Apenas sabia, segundo um contacto meu na GNR, que podia fazer a travessia em Vilar Formoso. Quando cheguei a Madrid (11 horas depois) é que voltei a pensar em encontrar uma solução pra chegar ao Porto…

Chegada a Madrid, toda a história dos voos e acabei por alugar carro. Felizmente não tive problemas nenhuns na estrada em Espanha. O e-mail do covid19@mne.pt chegou uma semana depois já eu estava em casa. Gostava que tivesse mais indicações concretas, para que pudesse passar aos meus leitores que continuam a manter o contacto comigo e que, com os meus contactos em vários países, tenho tentado ajudar. Espero que o Ministério dos Negócios Estrangeiros esteja a fazer o mesmo. Como vos disse, este desabafo serve de crítica construtiva, até porque tudo isto nos veio mostrar a fragilidade das nossas instituições e a fibra (ou a falta dela) de muitos dos nossos governantes… que isso também seja uma lição para nós e que nas próximas eleições votemos em quem realmente se preocupa com os cidadãos.
Fiquem bem!

Foto avião e neve © Viaje Comigo

© Viaje Comigo

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