Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo Entrada de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo
Publicado em Janeiro 24, 2019

Nada nos prepara para a visita a Auschwitz-Birkenau

Europa/ Notícias/ Polónia [ Cracóvia ]

Foi a mais difícil visita da minha vida, a do campo de concentração e extermínio de Auschwitz-Birkenau, na Polónia. Sabia que ia ser duro, mas tentei focar-me nos dados que ia ouvindo, através do auricular. Pensamos que sabemos como nos vamos sentir, mas é mentira… nada nos prepara para esta visita. Com uma voz serena e pausada – e ao mesmo tempo triste-, o guia, vai parando e explicando como a horrível história dos campos de concentração nazis se processou. Os campos de Auschwitz-Birkenau são o local mais visitado da Polónia, com mais de dois milhões de visitantes por ano. Uma coisa é certa: é impossível visitar Auschwitz e voltar igual. Veja o vídeo:

São hoje museus e locais que mostram as atrocidades que aqui foram cometidas, durante a II Guerra Mundial. Pode fazer a visita a Auschwitz-Birkenau sozinho, mas eu aconselhava a que tivesse um guia, pois eu gostei desse acompanhamento (apesar de ser inglês). Chamei-lhe guia, mas na verdade os “guias” daqui chamam-se “Educadores“, porque estão a ensinar-nos uma lição de História. A mais dura das lições. Chega-se ao fim da visita, com a alma pesada, mas a entender porque de facto toda a gente devia visitar estes locais. Custa muito… mas deve ser sempre recordado. Dois anos depois da Guerra acabar, os campos foram abertos e os primeiros Educadores foram os sobreviventes, por isso, é um papel de muita responsabilidade fazer estas visitas.

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Campo de concentração de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Chamam-se campos de concentração ou campos de extermínio? Diz-se que Auschwitz seria de concentração e Birkenau de extermínio, ainda que no primeiro existisse também câmara de gás e crematório. onde faziam as experiências, que depois colocariam em prática em Birkenau. Na verdade, estes campos ficaram mais conhecidos, mas existiram perto de 50 campos de concentração nazis (em vários países).

A visita de Auschwitz I começa pelo portão onde está a famosa frase “Arbeit Macht Frei” – “O trabalho liberta”. Seguem-se inúmeros edifícios, todos iguais, onde eram colocados os prisioneiros. Do lado de fora, separados por torres de controlo e arame farpado, estavam os edifícios dos oficiais nazis. Vamos parando para as explicações dos barracões e visitámos alguns, onde também têm painéis com a explicação em inglês e em polaco.

Fotografias de Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Fotografias da chegada dos comboios com prisioneiros a Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Entrada do campo de concentração de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

À medida que vamos passando entre os edifícios, impressiona a quantidade de fotografias e documentação guardada pelos alemães, numa tentativa de documentar a aniquilação de um povo… No edifício número 7, centenas de fotografias de prisioneiros dizem-nos a data de entrada no campo e da sua morte… Alguns duravam apenas dias… com fome, doentes, torturados… acabavam por sucumbir.

Se um prisioneiro escapava, os membros da família eram presos e enviados para Auschwitz. Tinham de ficar de pé a anunciar o porque de terem sido presos e que ficariam no campo até o fugitivo aparecer.

De março a agosto de 1942, os blocos 1-10 de Auschwitz I eram usados para as mulheres prisioneiras. Era separado da dos homens por um muro alto. Cerca de 17 mil mulheres judias e não judias foram deportadas da Alemanha e ficaram aqui. Durante esses meses, alguns milhares foram enviadas para as câmaras de gás ou morreram devido a epidemias, falta de higiene, fome e trabalho forçado. Aquelas que sobreviveram, em agosto de 1942 foram transferidas para o setor B1 do campo de Auschwitz-Birkenau.

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Parede de execução em Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Fotografias de Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Fotografias de mulheres e crianças em Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Fotografias de Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Fotografias da seleção de prisioneiros em Auschwitz-Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Os blocos 19 a 21 e 28 eram chamados de “Enfermaria” para os prisioneiros doentes. Mas, entre estes, era conhecido como a “Sala de Espera do Crematório”. Em 1941, os médicos das SS fizeram uma seleção de prisioneiros doentes, aqueles que seria menos provável que voltassem a trabalhar e era-lhes dada uma injeção letal ou iam para as câmaras de gás. Os pacientes da Enfermaria eram frequentemente usados para experiências médicas. Por outro lado, a “Enfermaria” também era considerada um local de resistência clandestina, especialmente para ajudar os mais doentes. Muitos sobreviveram assim.

No final da guerra, na cave do Edifício 11, foram encontrados, pelos soldados soviéticos, vários corpos de prisioneiros que morreram nos últimos dias de funcionamento do campo. Aliás, este Bloco 11 era chamado de “Prisão dentro da Prisão”, onde era punido quem tentava fugir ou fazia algo fora das regras estabelecidas pelos nazis.

De 1941 a 1943, as SS fuzilaram milhares de pessoas na parede de execução que ficava entre os Blocos 10 e 11. A maior parte dos executados eram presos políticos polacos, líderes e membros de organizações clandestinas e pessoas que ajudaram outros a fugir. A parede foi desmantelada, em 1944, mas o museu fez com que parte dela fosse reconstruída, como forma de memorial para recordar as vítimas.

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Campo de concentração de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Campo de concentração de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Conta-nos o Educador que, na chegada ao campo, separavam as famílias e as pessoas em várias categorias: os doentes, os mais velhos e os mais fortes, colocavam-nos a trabalhar, e “tentavam manter a calma ao deixarem as mães ficarem com filhos de colo”. Os mais “fracos” iam diretamente para as câmaras de gás.

Dentro do Museu, a sala 5 é das poucas que não se pode fotografar. Estão montes de cabelos que eram tirados aos prisioneiros e que eram vendidos, muitas vezes, para enchimento de colchões. São cinco montras gigantes de cabelos dos prisioneiros… mexe connosco.

Mas, o murro no estômago, continua nas outras salas, principalmente com os milhares de óculos, os milhares de pares de sapatos e outros objetos pessoais. “Podem ver que houve pessoas que traziam as chaves de casa. Davam-lhes esperança e acharam que iam voltar para casa…”, explica o Educador.

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Milhares de óculos dos prisioneiros – Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Montras com os sapatos dos prisioneiros – Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Montras com os sapatos dos prisioneiros - Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Montras com os sapatos dos prisioneiros – Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Depois de visitarmos Auschwitz I, que era tido como um campo mais administrativo, onde havia habitações de oficiais, vamos até Birkenau, esse sim chamado de Auschwitz de forma universal. À primeira vista, espanta pela imensidão: são quase 200 hectares e dezenas de barracões. Alguns foram destruídos, no final da Guerra, para fazer desaparecer provas.

Antes, o nosso condutor (do veículo que nos foi buscar e levar a Cracóvia) diz-nos que vai parar num local onde a maior parte das pessoas não vem: a estação de comboios original, onde deixavam os prisioneiros que depois tinham de caminhar alguns quilómetros até Birkenau. Posteriormente os comboios entravam mesmo dentro do campo. No chão, junto de vagões velhos, estão pedras com mensagens de paz e tolerância.

A caminho de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

“Nunca mais! Escolham o melhor para o mundo” – Junto da estação onde saiam os prisioneiros originalmente, a caminho de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Em Birkenau, a entrada pelo edifício horizontal, e com uma torre no meio, é-nos estranhamente familiar, de tantas vezes a termos vistos em documentários ou filmes. Foi por ali que milhares de prisioneiros passaram… e nós também caminhámos junto da linha de comboio, tal como eles o fizeram. Fazemos tudo a pé e é impossível não ficarmos invadidos por uma tristeza profunda. Os barracões ao lado das câmaras de gás e a descrição de como eram queimados os corpos e retirado o ouro que tinham nos dentes…

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Campo de extermínio de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Dentro da “Barraca da Morte” -campo de extermínio de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

"Barraca da Morte" - Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

“Barraca da Morte” – Campo de extermínio Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Uma das barracas que visitei em Birkenau era chamada de “Barraca da Morte” e usada para isolamento de prisioneiras que não tinham condições para trabalhar, antes de serem envidas para as câmaras de gás. Sem comida, nem água, apenas esperavam para serem enviadas para a morte.

Em 1945, quando os soviéticos chegaram ao local ainda existiam 7 mil prisioneiros vivos. Tão magros que pareciam esqueletos. Viam-se as valas comuns; e ainda se sentia o cheiro a queimado que vinha das câmaras de gás e fornos crematórios que também foram semi-destruídos, conservando-se, hoje em dia, os seus escombros. Estima-se que das 1,3 milhões de pessoas que passaram nestes campos de extermínio, 1,1 milhão terá morrido lá…

E porquê as câmaras de gás? Uma das explicações tem a ver com as experiências médicas macabras que os médicos nazis faziam; outra explicação está relacionada com o facto de, em tempo de guerra, querer poupar munições por cada prisioneiro – as balas eram caras – e o gás era mais rápido e mais barato…

Próteses retiradas ao prisioneiros - Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Próteses retiradas ao prisioneiros – Museu de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Louças dos prisioneiros – Museu de Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Há partes que, para mim, foram bastante arrepiantes: quando vemos a quantidade de objetos pessoais que estão expostos, como óculos, as próteses, os sapatos, as malas, e até os cabelos. Tudo das pessoas que chegavam aos campos, com alguma esperança de sobreviver à guerra, e eram despojadas de todos os seus bens… e da sua dignidade.

“Os nazis diziam que cada pessoa podia levar 25Kg, nas malas, por isso imaginem a quantidade de coisas que foram roubadas e enviadas para a Alemanha. Foi o maior roubo da História”, diz o Educador, referindo-se ao facto de os nazis terem dito que todos podiam levar malas para os campos de concentração e depois, mal saíam do comboio, era-lhes retirado tudo. “O maior roubo da História”, sublinha com a voz pesarosa. Penso que ser Educador, deve ser um dos trabalhos mais difíceis de sempre, ainda que com a rotina se devam habituar… mas há algo muito negro e negativo nestes locais.

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Vista da janela com grades no campo de extermínio de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Campo de Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Consegui sair da visita sem me emocionar e fiquei surpreendida comigo mesma. Porque sempre achei que me ia emocionar muito quando lá estivesse. Mas, mal sabia eu que era quando começasse a escrever que todos os sentimentos iriam ficar à flor da pele. E isto foi a primeira coisa que escrevi:

“Sobre Auschwitz-Birkenau:

Achamos que estamos preparados para a visita (de Auschwitz-Birkenau), de tanta vez que já ouvimos falar e de tantos documentários e filmes que já vimos.
Existem diferentes tipos de visitas, mas precisava que na minha tivesse tido mais tempo para absorver o que estava a ver… ou, até, o que estava a sentir.
Mas, ao contrário do que pensei, não foi lá que me começaram a surgir as lágrimas nos olhos e o aperto na garganta. Foi quando tive de escrever e editar as imagens.
É precisamente depois de estarmos lá que fazemos essa introspeção. E vou-vos dizer que pensei nas frases que são mais ditas quando falamos sobre o Holocausto: “para que nunca nos esqueçamos” e “que nunca torne a acontecer”.
E pensava nessa hipocrisia… nessas frases que infelizmente se tornaram banais. Porque, basta olhar para o mundo atual e ver que o Homem facilmente esquece.
Não houve uma fotografia que não associasse a crianças que, hoje em dia, sofrem em guerras. Às crianças mortas e resgatadas dos mares, em pequenos botes, perdidos nos mares; nos seres humanos que são vendidos e comprados, violentados, sujeitos torturas; nos muros que são montados em fronteiras e arames farpados… porque as pessoas nascem num país e, pelos vistos, na opinião de muitos, deverão estar condenadas a viver nesse país, nem que ele esteja em guerra, nem que não haja comida ou água…
Porque não houve um momento em que não me recordasse dos refugiados e de como o mundo os trata. Como se fossem diferentes de todos nós que tivemos a sorte de nascer num país sem guerras…
Que egoísta é o Homem que não se recorda que somos todos iguais… mas que uns são mais sacanas que outros.
E que… dar poder aos sacanas é como abrir caminho para que desgraças como o Holocausto aconteçam de novo.
Que não houve um momento em não me lembrasse do menino refugiado, morto na praia, que fizemos bandeira até nos esquecermos; que não houve um momento em que ao ver o arame farpado não me lembrasse de todos os que estão em campos de refugiados…
E que, ali, onde aqueles horrores aconteceram, se percebe como se chegou àquele ponto sem limites e sem retorno…
E, hoje em dia, continua a não haver limites para se desdenhar, envergonhar e humilhar todos aqueles que são simplesmente diferentes…
Não, desculpem, mas está mais do que provado que rapidamente a História é esquecida… Já nos esquecemos dos refugiados que vimos a semana passada nas notícias; já nos esquecemos do que um tirano é capaz de fazer quando ajudamos a propagar mensagens de intolerância, preconceito, racismo e xenofobia; e não, não nos lembramos que, no século XXI, existem milhões de pessoas no mundo que não tiveram as mesmas hipóteses de terem um vida livre, como nós.
Que precisam que os protejamos e que lutemos por eles.
Mais do que não esquecermos o passado é importante olhar para o presente e criar um futuro melhor para todos e não olhar só para o nosso umbigo.
Sejam felizes e sejam bons uns para os outros”.

Pode parecer estúpido o que vou dizer, porque mudamos todos os dias, mas é impossível visitar Auschwitz e voltar igual…

Nota: na Polónia, negar o Holocausto é considerado crime e pode ser preso por três anos, no mínimo.

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

“Aqueles que não recordam o passado estão condenados a repeti-lo”- frase em Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Memorial em Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

INFORMAÇÕES

Morada: Oswiecim, Polónia (a cerca de 70Km de Cracóvia, cerca de 1h30 de carro)
Site

Pode comprar aqui antecipadamente o Tour para ambos os Campos de Concentração –

– No interior não podem comer nem fumar
– Tem casas de banho no edifício central de Auschwitz I, antes de entrar para o complexo
– Só malas de certa dimensão podem entrar (certifique-se antes)
– Vai passar por segurança, na entrada, como nos aeroportos. Não pode levar armas, nem objetos perigosos.

Horários:
Aberto o ano inteiro, exceto1 de janeiro, 25 de dezembro e Domingo de Páscoa
Dezembro: 07h30 – 14h00
Janeiro e Novembro: 07h30 – 15h00
Fevereiro: 07h30 – 16h00
Março e Outubro: 07h30 – 17h00
Abril, Maio e Setembro: 07h30 – 18h00
Junho, Julho e Agosto: 07h30 – 19h00

Entrada: gratuita (mas tem de reservar no site, porque poderá já não ter no local; há um número limitado de bilhetes por dia); a visita guiada é paga (não há em português; fiz em inglês)
A visita não é aconselhada a menores de 14 anos.

– Fui com uma agência de viagens, de carro (porque fiz as Minas de manhã e Auschwitz de tarde), mas há transportes públicos para Oswiecim. Qualquer hotel terá essa informação para lhe dar, onde apanhar o autocarro e onde sair.

– Também há um autocarro que une Auschwitz e Birkenau e é grátis. Ajuda no Como Chegar.

Preços dos tours guiados (tem tours de 2 horas e meia e de 3 horas e meia). Os educadores têm de ser reservados, pelo menos, até 5 dias antes da visita.

Câmara de gás e crematório em Auschwitz I- Polónia © Viaje Comigo

Câmara de gás e crematório no campo de concentração de Auschwitz I- Polónia © Viaje Comigo

Câmara de gás e crematório em Auschwitz I- Polónia © Viaje Comigo

Câmara de gás e crematório no campo de concentração de Auschwitz I- Polónia © Viaje Comigo

Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

“Barraca da Morte” em Birkenau, Polónia © Viaje Comigo

Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

Loja com livros em Auschwitz I, Polónia © Viaje Comigo

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