Em 2019, o Ciclo 12 em Rede – Aldeias em Festa destaca a gastronomia das Aldeias Históricas de Portugal, como parte da sua cultura e História. Desta vez, foi a pitoresca aldeia de Piódão que acolheu um evento – “As Catraias da Estrada Real de Piódão” – e que inclui o showcooking, com o chef Rui Cerveira, da Casa da Esquila, onde foram usados diversos produtos regionais. Veja o vídeo da festa em Piódão, a propósito do “Ciclo 12 em Rede, Aldeias em Festa”.
Durante o evento, para que fosse mais fácil para os visitantes entrarem no espírito da aldeia e conhecerem mais sobre as suas tradições, foram colocadas informações nos pontos de destaque – pode ver aqui o guia do que visitar em Piódão – como do forno comunitário, da eira comunitária, no topo do monte – (onde se malhava o centeio e se faziam as descamisadas e secava o milho) – e até algumas explicações interessantes:
– As Cruzes nas portas: no dia três de maio – dia de Santa Cruz – depois da missa, as pessoas colocam pequenas cruzes na padieira da porta de entrada das casas, para afastar as trovoadas, os espíritos malignos e o demónio. As cruzes de madeira, louro e oliveira são feitas a partir do ramo benzido no Domingo de Ramos.
“Cruz bendita, aqui te coloco para guardares tudo aquilo que vires e não vires”
– “Portas e janelas azuis: um homem viajado trouxe uma primeira lata de tinta – azul, por acaso, para o Piódão e com ela pintou as portas e janelas de sua casa. Certo vizinho, ao ver o efeito, pediu-lhe um pouco de tinta fez o mesmo. Depois, um a um, todos os outros vizinhos lhe foram pedir um pouco de azul e seguiram o exemplo…”
No Casteleiro, perto de Sortelha, a Casa da Esquila é o restaurante do chef Rui Cerveira com espírito de “gourmet rural”, porque esse é o seu ambiente, onde vai mudando a carta consoante as estações e, claro, consoante os ingredientes disponíveis: “estamos no meio do mundo rural, numa pequena aldeia da Beira interior, sem pretensiosismos de ser mais do que aquilo que somos, um espaço onde comer e beber é o mais importante. Pretendemos com todo o nosso trabalho, despertar os sentidos de quem se senta nas nossas mesas, seja com propostas tradicionais simples, ou com algo mais arrojado que provoque as suas papilas gustativas”, diz a apresentação no site da Casa da Esquila.
Em Piódão, no showcooking ligado aos produtos das Aldeias Históricas, o chef Rui Cerveira trouxe esse conceito transformador, do seu restaurante , e apresentou quatro propostas de finger food, para ser mais fácil o público presente provar e também… foi como se fosse um pequeno menu de degustação regional:
– primeiro, apresentou uma “encenação” do que já muitas vezes ouvimos dizer, dos tempos que eram de “uma sardinha para 3”. Assim, com sardinhas assadas, fez uns petiscos, com creme de pimento caseiro e tomate de coração de boi. “Era por aqui que passavam as carroças que traziam peixe para o interior”, daí a ligação deste peixe que não havia em abundância e era dividido por várias pessoas, principalmente nas famílias grandes;
– depois, apresentou as “concertinas”: chouriças cortadas finamente (mas de forma a permanecerem ligadas) passadas no carvão (depois de ficarem em azeite durante algum tempo, para ficarem mais macias) que, quando ficavam assadas, parecem mesmo uma concertina;
– num terceiro momento, deu a provar queijo de Arganil com compota (caseira) de figos da área, em pão regional;
– e, para finalizar, um gelado (que está ligado ao gelo da serra e à época fria desta região), regado com o tradicional mel de urze, raspa de limão (que lhe dá um ar fresco, maravilhoso) e pedaços de Sequilhos, doces regionais, que parecem uma espécie de macarons à portuguesa.
O chef usou produtos regionais, numa desconstrução do que é tradicionalmente apresentado, para adaptar a petiscos e finger food que deram ideias ao público para fazerem, de forma fácil, em suas casas. E eram petiscos muito saborosos e (provados e) aprovados pelo público!
A festa do “Ciclo 12 em Rede, Aldeias em Festa” contou com muita animação teatral e musical em Piódão, onde também podia participar em atividades gastronómicas, caminhadas e visitar o Museu, por exemplo.
Recentemente foi feito um levantamento da “Gastronomia Identitária das Aldeias Históricas de Portugal”, onde se conseguiu recolher as receitas que a população indicou como as mais identitárias da aldeia de Piódão. As informações que constam aqui abaixo são desse mesmo estudo:
“Piódão é bem o exemplo de como o homem se adaptou ao meio ambiente em condições difíceis. Aldeia construída numa encosta da serra do Açor, apresenta-se em anfiteatro e manifesta, nos seus habitantes, as características dessa mesma situação geográfica. A serra foi o convite à permanência do homem que via nestas encostas óptimas pastagens para os seus gados. As fontes que existiam, também, em grande número, ajudavam à manutenção dos animais. Assim, os pastores ali se fixaram não só com os rebanhos mas também com cavalos e éguas. Provavelmente o nome Chãs de Égua terá nascido desse facto. A par destas actividades, que os habitantes do Piódão desenvolviam no local, houve a necessidade de praticar ou- tras actividades ligadas à agricultura. A produção de mel, que já fazia parte da ali- mentação, passou também a representar uma importante fonte de rendimento da população. O antigo concelho de Vide de Foz do Piódão passou, no século XIX ao extinto concelho de Avô, integrando-se actualmente no concelho de Arganil”, explica o estudo referido.
“No topo da aldeia ainda resiste a eira comunitária onde se tratavam os cereais, feijão e milho que serviam para a alimentação. Aqui a agricultura de subsistência rou- bou à serra pequenos fragmentos das encostas. Em socalcos plantam-se couves, feijão e algum milho, tratam-se oliveiras e pequenas manchas de vinha. Ali próximo, na zona da Fraga da Pena (numa das encostas da serra do Açor), há castanheiros, medronheiros e alguns carvalhos. A Mata da Margaraça é um nicho protegido, onde se podem observar as espécies da flora autóctone que ainda resistem. Este pequeno recanto tem bem preservado o manto vegetal típico que em tempos co- briu toda a serra do Açor. Da vegetação mais rasteira regista-se a importância das manchas de urze. Os incêndios de 2017 tiveram um impacto muito grande em toda a região que rodeia a aldeia, deixando milhares de hectares de desbaste”, explica o estudo da “Gastronomia Identitária das Aldeias Históricas de Portugal”.
Gastronomia da região
“A gastronomia do concelho de Arganil mostra uma clara adaptação a tudo o que se produzia familiarmente. Desde o suíno que se criava no quintal com as couves da horta, ao peixe que os rios davam. Bucho de Vila, trutas grelhadas do Alva, tigelada de Folques, arroz-doce, chanfana, cabrito assado no forno de lenha, carolos doces, sequilhos, farófias, sonhos e filhós de abóbora, que ajudaram o povo desta região a sobreviver, são hoje considerados tradicionais.
No concelho de Arganil há pratos que ainda continuam a ser preparados. A chan- fana com carne de cabra temperada com especiarias e vinho tinto. Os torresmos de carne de porco temperada com especiarias, que se deixa a marinar de um dia para o outro, o arroz de miúdos à Convento de Folques, com miúdos de cabrito e arroz.
Era uso, na altura em que os muitos lagares existentes trabalhavam, fazer a tiborna com bacalhau, couves cozidas e muito azeite, o bacalhau à lagareiro (bacalhau as- sado com batatas e cebolas com a casca, azeite e alho), os carolos com bacalhau e o bucho recheado com carne de porco. Haviam ainda as sopas que eram usadas como última refeição do dia: a ferventada, o caldo verde e a sopa à camponesa.
Durante os dias da semana era habitual comerem-se batatas cozidas com nabos, nabiças ou couves acompanhados de farinheira, alheira ou chouriça”, revelam as informações do levantamento efectuado para o estudo da “Gastronomia Identitária das Aldeias Históricas de Portugal”.
PRODUTOS EM DESTAQUE
• O Presunto;
• A Broa de Milho e Broa de Batata;
• A Aguardente de Medronho;
• O Mel de urze;
• O Queijo da Serra;
• Vários Licores.
PRATOS EM DESTAQUE
• Carne de Festa ou Chanfana;
• Cabrito Assado;
• Sopa Serrana;
• Caldo de Panela;
• Bacalhau;
• Açorda;
• Bucho de porco recheado;
• Trutas grelhadas.
PRODUTOS GASTRONÓMICOS DIFERENCIADORES
O Bucho recheado: um pequeno saco feito recheado com carne de porco, cebo- la e arroz com condimentos fortes.
Para além deste prato, há um conjunto de produtos tradicionais que facilmente se encontra. O Presunto, a Broa de Milho e Broa de Batata, a Aguardente de Medro- nho, o Mel de Urze, o Queijo da Serra e uma série de Licores. A grande maioria destes produtos são produzidos nas imediações da aldeia.
Receita da Chanfana
Ingredientes:
Carne de cabra (partida aos bocados), alho esmagado com a casca, azeite, vinho tinto, louro, sal, especiarias a gosto.
Modo de preparação:
Coloca-se a carne dentro de um caçoilo de barro e tempera-se com sal, alho esmagado (com a casca), com azeite e vinho até cobrir. Tapa-se e deixa-se assim de um dia para o outro. Vai ao forno, de preferência de lenha, até a carne ficar tenra.
Receita de Queijo curtido
Modo de preparação:
Depois do queijo estar duro faz-se o molho com óleo, colorau e piripiri. Com um paninho esfrega- se o queijo com este molho. Põem-se a secar numa tábua.
Queijo fresco de cabra
Ingredientes:
1 litro de leite de cabra, 1 colher de chá de coalho
Modo de preparação:
Passa-se o leite, através de um pano limpo, para uma panela. Amorna-se um bocadinho ao lume. Retira-se do lume e junta-se o coalho. Mexe-se, novamente, para coalhar. Quando a coalhada estiver pronta, põe-se no cincho a pouco e pouco. Calca-se muito bem e depois põem-se umas pedrinhas de sal grosso por cima. Vai ao frigoríficos (1 a 2 dias).
Sopa de botelha
Ingredientes:
Água, sal, azeite, botelha (abóbora), feijão, batata, massa
Modo de preparação:
Põe-se uma panela ao lume com água sal e azeite. Deixa-se levantar fervura, junta-se botelha cortada aos bocadinhos, depois de descascada. Junta-se o feijão, a batata e mais tarde a massa.
Sopa serrana
Ingredientes:
Batatas, cenouras, feijão, cabeça de nabo, alho, cebola, couve portuguesa, tiras de presunto, azeite, sal
Modo de preparação:
Cozem-se os legumes com o sal e o azeite. Depois de cozidos passam-se e juntam-se-lhes alguns feijões inteiros, cenoura às fatias e, por fim, as couves já devidamente lavadas e esfarrapadas.
Tigelada
Ingredientes:
Açúcar a gosto, 12 ovos, 1 l de leite, canela, casca de limão
Modo de preparação:
Batem-se muito bem os ovos, o açúcar, a canela e o limão. Por fim, junta-se o leite e mistura-se bem. No final retira-se a casca de limão e deita-se o preparado numa tigela de barro vidrada e leva-se ao forno a cozer até ficar com uma crosta dourada.