23:09 do dia 8 Setembro 2023 - Marraquexe - Marrocos © Viaje Comigo Foto tirada dois minutos antes do sismo: 23:09 do dia 8 Setembro 2023 - Marraquexe - Marrocos © Viaje Comigo
Publicado em Setembro 14, 2023

Viajar para Marrocos depois do sismo e Como Ajudar

África/ Marrocos

Se há textos que doem a escrever, este é um deles. Mas é também muito necessário, porque acredito que quem tem viagem em breve, para Marrocos, esteja com muitas dúvidas. Este é um país que me é muito próximo. Marraquexe é a minha segunda “casa” e estava lá (como tour líder de um grupo) quando aconteceu o sismo de 8 de setembro de 2023.

Acordar todos os dias com as notícias das aldeias das montanhas, e o número de vítimas a subir, deixa-nos muito tristes com toda a situação. Sobretudo frustrados porque queríamos ajudar muito mais. Por tudo isso, como quase tudo na vida, haverá sempre diferentes opiniões sobre o que se deve fazer: visitar ou não visitar um país que turisticamente se está a reerguer de uma catástrofe natural?

Djema El Fna - Marraquexe - depois do sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Djema El Fna – Marraquexe – dia depois do sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Porque sei que muitos se focam somente na destruição, nos destaques do Instagram compilei  informações sobre como a área da Medina estava. A verdade é que, na manhã a seguir ao sismo, achei que ia encontrar muita maior destruição. Isso porque conheço bem a cidade e sei que tinha muitos prédios e casas em risco de caírem e devolutos há anos. Além disso, muita da construção tem séculos de História. Para mim, é um verdadeiro milagre não terem caído todos os edifícios como um baralho de cartas, dentro da Medina.

Muitas lojas ficaram com grandes prejuízos, porque as cerâmicas, espelhos, e tudo o que é de partir facilmente se quebra durante o sismo. Mas mesmo aí… fiquei surpreendida por não terem ficado todas as lojas com tudo partido. Porque o abalo foi muito forte!

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Tenho também no mesmo destaque do IG (Sismo RAK) um vídeo dentro de uma loja de cerâmica. Quem já visitou Marraquexe, conhece também a arte de empilhar coisas. A loja tem milhares de peças de cerâmica e poucas foram as que caíram e se partiram. Porque uns edifícios sentiram mais o abalo do que outros?… Deixo isso para os geólogos e demais especialistas explicarem.

Apesar de tudo o que se passou sei, pelas pessoas com quem trabalho e que estão lá, que tudo está a voltar ao normal… dentro do possível! Os escombros estão a ser retirados, as estradas estão limpas de pedregulhos e, depois de três dias de luto nacional, os próprios marroquinos começaram a voltar à sua vida.

Nas montanhas intensificaram-se as procuras por mais pessoas, que tenham ficado desaparecidas nas casas. Confesso que é difícil de assimilar, mesmo tendo estado lá. É difícil de aceitar que pessoas que viviam já em tão precárias condições tenham sido vítimas de algo tão violento e inesperado. E tantos deles são familiares e amigos de nossos amigos :(.

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Pessoas a dormirem na praça – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Sempre que um destino sofre com uma catástrofe, todos nós (viajantes) nos interrogamos a certo momento se devemos manter a nossa viagem ou cancelar. E apesar de tudo o que posa ser dito e mostrado, esta é uma escolha muito pessoal. Cada um deve decidir o que acha melhor, na altura da sua decisão.

Como conheço muita gente lá e tenho gente amiga, sei que o facto de não os visitarmos será mais algo para dificultar a vida de quem vive do turismo.

E, se pensarmos um pouco, tudo vive do turismo! Desde o agricultor que manda a fruta e legumes para os restaurantes, até aos músicos na praça Djemaa El Fna, passando pelos hotéis e condutores de transportes de turismo, até às lojas que vendem toda a marroquinaria.

Recordando um pouco a altura da Covid, Marrocos foi dos países que mais tempo esteve de fronteiras encerradas. Cheguei a fazer lá tours – e vivi lá quase dois meses – entre setembro e outubro, e fecharam de novo em novembro de 2021, para só abrirem de novo em fevereiro de 2022. O nível de pobreza aumentou muito e, sobretudo em Marraquexe, muita gente tem de trabalhar hoje para conseguir comer e sustentar a família amanhã. Dito isto…

Mesquita cuja fachada caiu - Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Mesquita cuja fachada caiu – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Argana – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

DEVES VIAJAR PARA MARROCOS?

Mais uma vez é uma escolha muito pessoal. E existem tantas e diversas razões, sendo todas válidas, seja para o sim ou para o não.

– Muitos se interrogam e estão preocupados porque, como turistas, estão a tirar recursos (de comida ou atendimento no hospital, se for o caso) dos habitantes locais que precisam mais.

– Outros poderão sentir que é desrespeitoso estar em modo de “férias” e até mostrar alegria, quando o número de vítimas do sismo não pára de aumentar e os locais estão a viver nas ruas.

– Podem não querer lidar com a destruição local e o sentimento de perdas de vidas, em alguns locais.

– Outros pensam que as infratestruturas podem ter sido comprometidas e têm receio de ficar em hotéis e andar em ruas com prédios em risco de ruína.

– Outros terão receio que o sismo se repita, ou que réplicas fortes tenham lugar, podem fazer cair mais edifícios e rochas nas montanhas.

– Receio de que as vistorias não tenham sido feitas em edifícios que apresentem fissuras.

TODAS estas são razões muito válidas para se adiar e/ou cancelar a viagem, para uma outra altura em que tudo tenha voltado mais ao normal. 

De qualquer das formas, e como disse acima, há sempre dois lados de qualquer história. E diferentes perspetivas de como lidar com a situação. Principalmente para quem conhece bem o setor do turismo e como os próprios marroquinos me disseram “não vão embora, por favor. Marraquexe já está a voltar ao normal”.

O turismo é uma enorme força económica de Marrocos e representa uma grande fatia do PIB (7,7% Produto Interno Bruto). Dados de 2019, ano pré-pandemia, mostram que recebeu mais de 13 milhões de visitantes e gerou quase 10 biliões de euros. Com a pandemia a queda foi abrupta: em 2021, desceu para 3,72 milhões de visitantes e 4,6 biliões de euros (info).

– De acordo com o que vi em Marraquexe, logo no dia a seguir ao sismo já havia a remoção de tudo o que tinha derrocado. Nos dias seguintes, vimos várias vezes inspetores a verificarem as fachadas de inúmeros edifícios.

– Marraquexe, ao contrário de outras cidades, onde há agricultura de subsistência e outros meios de vida, vive quase exclusivamente do turismo. Sem ele, muita gente passa fome.

– O dinheiro que entra no turismo para as lojas, servirá também para os arranjos dos espaços e edifícios. Todos precisam de nós.

– A solidariedade de todos os marroquinos é enorme. Dois dias depois do sismo, vendo que não se conseguia chegar a aldeias destruídas, saíram de várias cidades com água, comida, tendas, roupas e colchões, para darem a quem tinha ficado sem nada. Se não têm dinheiro porque o turismo está parado… não vão conseguir ajudar mais os outros.

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Limpeza em Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

– Área mais afectada: foi nas remotas aldeias das Montanhas do Alto Atlas. Claro que são enormes montanhas e atravessam grande parte do território, mas as aldeias mais atingidas estão a cerca de 100km a sul de Marraquexe.

– A área mais afectada não é tão turística. Portanto, agradece-se  que não vão fazer “turismo” para as aldeias que foram totalmente destruídas.

– A parte nova da cidade de Marraquexe teve estragos menores do que na Medina. As pessoas que vemos a dormir a rua, de facto encontram algumas fendas nas suas casas, mas o que as faz dormir na rua é o facto de as casas ainda não terem sido vistoriadas. Algo que acontecerá em breve, segundo me informaram.

– A não ser que o o Riad que reservou para dormir apresente danos do sismo, é seguro ficar dentro da Medina. Também no exterior da muralha, os grandes hotéis e resorts estão a funcionar, assim como os souks da Medina e os centros comerciais.

– Mesmo com o sismo a 8 de setembro nunca pararam as obras que estão a ser feitas para receberem um gigante evento do FMI e Banco Mundial, de 9 a 15 de outubro. Datas que não foram alteradas – evento que vai ser dezenas de milhares de participantes.

– Os voos de e para Marraquexe nunca pararam. Aliás, na noite do sismo era possível ver o intenso (e normal) tráfego aéreo. No entanto, algumas companhias aéreas facilitaram e pode reagendar o seu voo.

Atenção aos seguros de viagem. Se cancelarem, poderão não ter nenhum dinheiro de volta, uma vez que os seguros não incluem cancelamentos que sejam devido a desastres naturais.

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Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

COMO AJUDAR MARROCOS?

Se por um lado, não cancelar a sua viagem é uma forma de ajudar os marroquinos e o país… muita gente quererá ajudar mesmo sem viajar.

Uma forma de ajudar Marrocos é apoiar organizações de solidariedade. Existem variadas que estão a cuidar dos que estão na rua e foram atingidos pelo sismo, através de doações. O dinheiro serve para alimentação, tendas, colchões, roupas e outros objects, uma vez que nas montanhas as famílias que sobreviveram ficaram com tudo soterrado.

Deixo alguns links, que fui verificar para ver se eram de associações fiáveis e coloco aqui para poderem ajudar:

SOBRE O SISMO

  • Às 23h11 do dia 8 de setembro de 2023, um sismo com uma magnitude de 6.8 na Escala de Richter foi sentido em Marrocos, provocando a morte de quase três mil pessoas e ferindo mais de cinco mil.
  • O epicentro foi localizado a cerca de 70Km a sudoeste de Marraquexe, sobretudo nas montanhas do Atlas onde muitas aldeias estão “encaixadas” em vales.
  • Apesar do forte abalo, a Medina de Marraquexe ficou apenas com alguns edifícios destruídos, uma vez que muitos deles são dos século 12 – que são Património da Humanidade da UNESCO. O bairro Judeu (chamado de Mellah) foi um do mais atingidos e é daí que são as pessoas que estão a viver na rua, junto ao bairro e ao que restou das suas casas.
  • Pontos turísticos: o Palácio Bahia encerrou porque algumas partes, como o telhado de entrada, caíram. Está a ser recuperado  e estão a verificar os estragos antes de reabrirem portas.
  • No dia 11 de setembro 2023, o Portal das Comunidades do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal publicou que “Na sequência do terramoto de 8 setembro, desaconselham-se todas as deslocações para as zonas mais diretamente afetadas, situadas nas montanhas do Atlas (províncias de Al Haouz, Taroudant, Chichaoua e Ouarzazate).”

    Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

    Marraquexe – algumas lojas a limpar e já abertas no dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

A minha experiência do sismo:

Estava com um grupo de 22 pessoas, como tour líder, no terceiro piso do Café Argana. Levantei-me e fui junto do vidro fazer fotografia e vídeo da praça (a foto de abertura foi tirada às 23h09). Às 23h11, o chão começou a tremer muito e parecia que o edifício se ia desintegrar a qualquer momento. Dizem que durou 15 a 30 segundos. E o barulho vinha da terra, com um grande tremor, como se nos fosse engolir.

Primeiro, parecia simplesmente um enorme camião a passar, depois lembrei-me que podia ser um atentado (este café foi alvo de um atentado em 2011), e até me lembrei que podia ser só má construção do edifício. Confesso… o sismo foi a última coisa em que pensei! Faço tours para a Tailândia, Indonésia e Islândia… Nunca me passou pela cabeça que seria em Marraquexe que isto iria acontecer.

Talvez por ser um edifício mais recente – foi reconstruído depois do atentado – o Argana aguentou-se bem. Estava eu ainda a retirar algumas pessoas do terraço, no terceiro andar, do lado esquerdo, quando do lado direito o telhado caiu. Pura sorte, tivemos nós, que chegamos à praça Jemma el-Fna apenas com uma pessoa com um ferimento ligeiro na perna.

Coloquei a mensagem no Instagram a dizer que estávamos todos bem. Só imaginava as famílias dos meus viajantes (e a minha) preocupadas. E só aí vimos, na internet – nunca ficamos sem luz, nem água, nem comunicações – que era mesmo um sismo. Evitamos ruas estreitas e mantivemos-nos afastados de edifícios e, nessa noite, dormimos em frente ao nosso Riad no parque de estacionamento, com tapetes no chão e cobertores. Tivemos também sorte que o Riad tem uma construção recente e não apresentava fissuras vindas do sismo.

As ambulâncias não paravam de passar por nós para acudir quem morava no bairro judeu, onde várias casas caíram. Quando as notícias devastadoras das aldeias nos começaram a chegar, ficamos destruídos por dentro. E assim continuamos… são familiares e amigos dos nossos amigos. A dor é profunda, mas como eles próprios me dizem: “a vida tem de continuar e temos de cuidar do vivos”. A reconstrução ainda vai demorar e eles precisam de nós.

A resiliência deste povo não tem limites e os habitantes de Marraquexe, logo no dia a seguir, já estavam a limpar tudo. No segundo dia, as lojas já começavam a funcionar. E ao terceiro dia “quase” tudo estava aberto. Voltei a Portugal não por receio, mas porque já tinha o voo para dia 12 e compromissos inadiáveis. Mas espero regressar em breve para ajudar in loco os meus amigos marroquinos. Até lá, ajudo através de doações para as associações no terreno.

Espero que, com estas ideias e diferentes perspetivas, consigam ter uma ideia mais clara do que fazer. Os nossos maiores sentimentos para com o povo marroquino!

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Palácio Bahia fechado - Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Palácio Bahia fechado – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Bairro Judeu – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Marraquexe - dia a seguir ao sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Ervanária a ser limpa – Marraquexe – dia a seguir ao sismo – Marrocos © Viaje Comigo

Casa de Marraquexe depois do sismo - Marrocos © Viaje Comigo

Casa de Marraquexe depois do sismo – Marrocos © Viaje Comigo

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